PROPOSIÇÃO DE PASSAGEM do GE 23 a GT
No ano de 2003, durante a 26ª Reunião Anual da Anped, realizada em Poços de Caldas, um entusiasmado grupo de pesquisadoras/es, docentes e estudantes mobilizou-se para propor à Associação a criação de um Grupo de Estudos que se voltasse para as temáticas de gênero e sexualidade em sua articulação com o campo da educação. Com o expressivo apoio da assinatura de cerca de 500 colegas, a proposta foi levada à Assembleia Geral daquela 26ª RA e aprovada. Criava-se, assim, o GE 23 Gênero, sexualidade e educação. A rede de estudiosas/os e pesquisadores/as que já há vários anos ensaiava contatos menos formais no âmbito da Anped ganhava agora um espaço privilegiado. Os muitos grupos e núcleos de pesquisa ligados aos estudos de gênero, de sexualidade e de educação sexual existentes nas instituições de ensino superior e nos programas de pós- graduação do Pais, dispersos e distantes uns dos outros, passavam a ter o GE 23 como um ponto de referência; aqueles pesquisadoras/es e estudantes que, isoladamente, desenvolviam investigações ou ensaiavam práticas pedagógicas focadas nessas temáticas eram estimulados, agora, a buscar na Anped parceiras/os para o diálogo e para o debate teórico. Enfim, o movimento que realizávamos naquele momento não tinha por objetivo, propriamente, “inventar” um novo grupo de estudos, mas sim propiciar um espaço legitimado, no interior da mais importante associação brasileira de educação, para que essa rede – que já existia – pudesse se tornar visível e, consequentemente, pudesse se fortalecer.
Passaram-se dois anos e demos passos importantes nessa direção. Hoje, trazemos a esta Assembleia uma nova proposição: a transformação do GE 23 em GT. Com esta mudança, estamos certas/os de que o intercâmbio e a discussão acadêmica desencadeados no contexto do GE terão condições de se desenvolver ainda mais plenamente. Para embasar nossa proposição, destacamos alguns elementos.
“Acreditamos não ser mais necessário enfatizar a importância que as dimensões de gênero e sexualidade adquiriram na teorização social, cultural e política contemporânea. De fato, desde o final dos anos 70 do séc. XX, uma ampla, complexa e profícua produção acadêmica vem ressaltando a impossibilidade de se ignorarem relações de gênero e sexualidade quando se busca analisar e compreender questões sociais e educacionais. Estudiosas/os e pesquisadoras/es de várias nacionalidades e filiações teóricas e disciplinares participaram e continuam participando da construção desses campos, numa perspectiva que focaliza tanto relações de gênero e sexualidade quanto suas importantes articulações com dimensões como raça/etnia, classe, geração, nacionalidade, religião, dentre outras” (Meyer, D.; Ribeiro, C. e Ribeiro, P., 2004).
Com essas palavras era iniciada a primeira sessão de apresentação de trabalhos no contexto do GE 23, na Reunião Anual de 2004. As colegas Dagmar Meyer, Claudia Ribeiro e o colega Paulo Rennes Marçal Ribeiro traziam ao grupo as experiências dos núcleos de estudo a que estavam vinculados ao mesmo tempo em que justificavam o “nascimento” do GE na Anped.
Sua exposição continuava, demonstrando que esse movimento havia se afirmado, no plano acadêmico internacional, especialmente, a partir dos departamentos de Women´s Studies e posteriormente se ampliara com os Gender Studies e os Gays and Lesbian Studies. Ressaltavam a multiplicação desse movimento em muitas instituições universitárias e centros de estudos e o quanto ele havia impulsionado pesquisas nos mais diversos campos, tais como a educação, a história, o direito, a literatura, a arte, a saúde, a teologia, a política, etc. No entanto, acentuavam que a expansão dos estudos e pesquisas no plano internacional “não se visibiliza do mesmo modo nos currículos formais de graduação e pós-graduação em educação do País”; chamavam atenção para o fato de que, apesar de já contarmos com vários núcleos e grupos de estudo sobre o tema cadastrados no CNPq, continuava “existindo uma lacuna curricular no que diz respeito a essas temáticas e que elas ainda não aparecem, com muito destaque, na pauta dos grandes eventos ou na agenda de revistas importantes da área da educação.” (Meyer, D.; Ribeiro, C. e Ribeiro, P., 2004). Essa lacuna parece ainda mais importante se lembrarmos que, a partir de 1996, o Ministério da Educação incluiu “orientação sexual” como “tema transversal”, nos seus Parâmetros Curriculares Nacionais. As diretrizes que eram, então, propostas pelo Ministério exigiam que as questões de gênero e sexualidade tratadas no âmbito escolar estivessem afinadas com as teorizações contemporâneas.
Os dados trazidos pelos colegas acenavam para uma situação que todos buscamos contribuir para modificar. Por um lado, observamos um número cada vez maior de teses de doutorado e dissertações de mestrado que assumem gênero e sexualidade como seu foco central ou, pelo menos, como dimensões indispensáveis para a constituição de seus objetos de estudo, bem como teses e dissertações que analisam ou propõem projetos de educação sexual nas escolas brasileiras; registramos também um aumento de publicações na área (livros, artigos e mesmo algumas revistas de projeção internacional, como a Revista de Estudos Feministas e a Pagu) e, por outro lado, continuam os nossos cursos de formação e qualificação de docentes beneficiando-se muito pouco de toda essa produção.
Por todas essas razões, reafirmava-se, naquele momento inaugural do GE tal como se reafirma agora, a importância da constituição deste espaço no interior da Anped como um marcador do movimento de consolidação acadêmica e política desse campo. A pluralidade teórico-metodológica e a constante autocrítica que tem acompanhado a produção de conhecimento nos estudos de gênero e sexualidade eram ressaltadas pelos colegas que abriam as discussões do GE e logo se mostrariam evidentes nas exposições e debates.
Após a aprovação do grupo na Reunião de Poços de Caldas, foram tomadas providências para a efetiva constituição do GE, numa intensa troca de contatos entre a coordenação recém eleita, a Secretaria da Anped e as pessoas mais diretamente envolvidas com a criação do grupo. Para o primeiro biênio, haviam sido escolhidos para ocupar o cargo de coordenadora do GE a professora Guacira Lopes Louro, da UFRGS e de vice-coordenador, o professor Paulo Rennes Marçal Ribeiro, da UNESP (Campus Araraquara). Com o objetivo de engajar novos colegas e divulgar o GE foi organizada, ainda em novembro de 2003, uma lista de discussão via internet, bem como providenciada a inclusão da notícia nos sites de alguns dos núcleos e das revistas acadêmicas voltadas para a temática. Importante referir que, neste processo de organização inicial, bem como em todas as etapas que se seguiram ao longo desses dois anos, contamos sempre com o apoio solícito do pessoal da Secretaria e da Diretoria da Associação para esclarecimentos.
Em atendimento às exigências regimentais, foi constituído imediatamente o grupo de consultores ad hoc que passou a ser integrado pelas professoras Ana Camargo (Universidade de Uberaba e Unicamp), Claudia Ribeiro (Universidade Federal de Lavras), Dagmar Estermann Meyer (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), Mary Neide Damico Figueiró (Universidade Estadual de Londrina), Maria Eulina Pessoa de Carvalho (Universidade Federal da Paraíba), Jane Felipe (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) e pelo vice-coordenador do GE, professor Paulo Rennes Marçal Ribeiro (Universidade Estadual Paulista – campus Araraquara) – todos docentes com a titulação de doutor e registrando experiência de pesquisa, orientação de dissertações e teses e avaliação de projetos na área específica do GE.
Ao longo do ano de 2004, realizamos uma série de atividades que, de modo direto ou indireto, visavam a preparação para participação do grupo na 27a RA. A par da presença da professora Guacira Louro da reunião dos coordenadores e da diretoria da Anped no Rio de Janeiro, destacamos a participação de pesquisadores ligados ao GE na V Anped Sul - Seminário de Pesquisa em Educação da Região Sul, realizado em Curitiba-PR, em abril de 2004 e a realização do Colóquio sobre gênero, sexualidade e educação, promovido pelo GEISH, o Grupo de Estudo Interdisciplinar em Sexualidade Humana, da Faculdade de Educação da UNICAMP. Na Anped Sul, o GE 23 se fez representar por meio de um painel organizado pelo Grupo de Estudos de Educação e Relações de Gênero, GEERGE, da UFRGS, do qual participaram como painelistas as professoras Dagmar E.Meyer, Jane Felipe e Guacira Louro e o professor Luis Henrique Sacchi dos Santos (da Universidade Luterana do Brasil/ ULBRA). O Colóquio sobre gênero, sexualidade e educação, promovido pelo GEISH, aconteceu na UNICAMP, também em abril, e merece um destaque significativo uma vez que, além de espaço para aprofundamento da discussão teórica, se constituiu em uma oportunidade especial para encontro da coordenadora, do vice-coordenador e de algumas das consultoras ad hoc que, assim, tiveram possibilidade de tratar da agenda do GE para a reunião anual.
Para a 27a RA, foram encaminhados ao GE para avaliação 23 propostas de trabalho, 05 propostas de pôsteres e 02 propostas de minicurso. Cada texto foi encaminhado para dois consultores, uma vez que, na condição de GE, não participamos do Comitê Científico. Desse processo resultou a aprovação para apresentação de doze trabalhos, todos os pôsteres e o mini-curso intitulado “Novos tempos, novos desejos, práticas sexuais nem tão seguras: sinais de tensão nos discursos da sexualidade, a partir de questões trazidas pela trajetória de enfrentamento do HIV/AIDS no Brasil”. Além dos trabalhos selecionados, contamos também com um trabalho encomendado, intitulado “Gênero, sexualidade e educação. ´Olhares´ sobre algumas perspectivas teórico-metodológicas que instituem num novo GE”, A par dessas atividades realizadas no contexto do grupo, o GE 23 também se integrava ao GT 03 Movimentos Sociais e Educação, como apoiador da sessão especial intitulada “Igualdade e diversidade na Educação: possibilidades e tensões”. Nessa sessão, a professora Sarah Whitelaw, da Universidade de Leeds, abordaria especificamente a questão sob a ótica do gênero. Finalmente, ainda naquela Reunião Anual, o GE participou mais diretamente de uma sessão de conversas, intitulada “Inclusão e diferença na formação inicial e continuada de professores: uma discussão de questões contemporâneas com pesquisadores do Reino Unido”. Essa sessão, que teve a participação das professoras Sara Whitelaw e Andréa Utley (da Universidade de Leeds), e dos professores Laura Hills (Universidade de Durham) e Gary Wilson (da Secretaria de Educação de Kirkless) fora viabilizada graças ao intercâmbio acadêmico que a profa. Maria Eulina de Carvalho, deste GE, vem mantendo com estudiosos do Reino Unido ligados às questões de gênero e educação.
Ao longo da R.A, o grupo contou com a presença de cerca de 50 participantes em todas as suas sessões que se distribuíam por 39 universidades, fundações Educacionais e centros Universitários e ainda por oito prefeituras, secretarias municipais de educação e direitos humanos. Ao encerrar a 27a Reunião, colegas e estudantes presentes, ao mesmo tempo em que avaliaram como positiva a atuação do GE no seu primeiro ano de funcionamento, manifestaram o propósito de ampliar a divulgação deste espaço entre outros grupos e núcleos de estudo e pesquisa sobre gênero e sexualidade existentes no País.
Esse propósito foi levado a efeito, ao longo do ano de 2005. Os contatos acadêmicos entre os participantes do GE aumentaram, o que é constatado, especialmente, na constituição das bancas de mestrado e doutorado nos diversos programas de pós-graduação e na solicitação de consultorias ou pareceres. De modo especial destacamos, dentre as atividades realizadas nessa direção, o I Simpósio Paraná - São Paulo de Sexualidade e Educação Sexual, promovido pela Universidade Estadual Paulista (Campus Araraquara) sob a presidência do prof. Paulo Rennes Marçal Ribeiro (vice-coordenador do GE 23 e coordenador do Núcleo de Estudos da Sexualidade daquela Universidade). O evento, que reuniu cerca de 200 participantes, contou com a colaboração da Universidade Paulista, da Universidade Estadual de Londrina, do Centro Universitário de Maringá (Cesumar) e com o apoio da ANPEd, por meio do GE 23. À convite da organização do Simpósio, a conferência de abertura foi realizada pela professora Guacira Lopes Louro, como coordenadora do GE Gênero, sexualidade e educação. Pretendia-se, assim, não só trazer à discussão algumas das instigantes teorizações contemporâneas da área, mas também tornar visível, para um grande número de pesquisadoras/es e estudantes, o novo grupo da Anped, estimulando o engajamento de outros núcleos. É importante ressaltar que, por ocasião do evento, realizou-se também um fórum com representantes de 19 grupos de pesquisa sobre gênero, sexualidade e/ou educação sexual vinculados às instituições acadêmicas que estavam ali presentes (note-se que o simpósio reunia os estados de Paraná, São Paulo e alguns poucos representantes do Rio Grande do Sul e Santa Catarina o que nos dá uma idéia da vitalidade da área, pois podemos estimar que o número seria muito maior se o encontro tivesse o caráter nacional).
Para a 28a Reunão Anual, deste ano de 2005, o GE 23 recebeu 19 propostas de trabalhos, 07 de pôsteres e uma de minicurso. Foram aprovados para apresentação 13 trabalhos, os sete pôsteres e o minicurso, intitulado Perguntas gerando perguntas na Educação Sexual. O GE promoveu também uma sessão de conversas intitulada A inserção da escola no combate à violência e à exploração sexual infanto-juvenil, por iniciativa das professoras Jane Felipe (GEERGE/UFRGS) e Cláudia Ribeiro (GEISH/UNICAMP); e integrou a sessão especial promovida pelo GT de Educação Popular, intitulada Corpo, violência e educação, através da participação da colega Dagmar Meyer (UFRGS) que abordou questões relativas a corpo e gênero.
Tal como ocorrera em 2004, durante todas as sessões do grupo, foi expressiva a presença de docentes e estudantes de muitas universidades e instituições de ensino, bem como ligados a secretarias de educação e prefeituras. Neste conjunto de participantes, destacamos professores/as da rede municipal de Caxambu que integraram todas as sessões e, de modo especial, acompanharam com entusiasmo o minicurso. Por certo, a divulgação realizada pelos membros do GE durante 2004 surtiu efeito, uma vez que muitos outros núcleos e grupos de pesquisa se fizeram presentes nesta 28ª R.A. Estaremos encaminhando, posteriormente, à Secretaria, dados objetivos dessas presenças, o que não podemos fazer neste momento, uma vez que a redação dessa proposta está sendo feita durante a Reunião Anual e, portanto, ainda não dispomos dos relatórios finais.
Acreditamos que essas considerações já se mostram suficientemente fortes para embasar nossa proposição de passagem do GE Gênero, sexualidade e educação para a condição de GT.
Caxambu, 28ª Reunião Anual da Anped