ABALF e GT 10 da ANPEd criticam fala presidencial sobre aplicativo de alfabetização e repudiam ofensas a educadores

A Associação Brasileira de Alfabetização (ABALF) e o GT 10 da ANPEd, dedicado à pesquisa de de Alfabetização, Leitura e Escrita, manifestam-se em repúdio a falas do presidente da República no último debate da corrida eleitoral. O referido senhor afirma que o aplicativo “Graphogame”, instrumento que compõe a Política Nacional de Alfabetização (PNA), “alfabetiza em seis meses”, sugerindo o descarte da intervenção docente. E mais, sem noção alguma do que seja construção científica, feriu intelectuais brasileiros, reconhecidos nacional e internacionalmente, dirigindo críticas infundadas a Paulo Freire e Magda Soares. Dizer que Paulo Freire “falhou” em seus estudos sobre alfabetização é um verdadeiro escárnio.

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MANIFESTAÇÃO DA ABALF E DO GT10 DA ANPED SOBRE “ALFABETIZAÇÃO  EM SEIS MESES A PARTIR DE UM APLICATIVO” SUGERINDO O DESCARTE DA INTERVENÇÃO DOCENTE

Ao tomar conhecimento da fala do Sr. Jair Bolsonaro,  proferida no dia 16 de outubro, durante o Debate na Rede de televisão Bandeirantes, a ABAlf e a ANPEd não poderiam ficar inertes. O referido senhor afirma  que o aplicativo  “Graphogame”, instrumento que compõe a Política Nacional de Alfabetização (PNA),  “alfabetiza em seis meses”, sugerindo o descarte da intervenção docente. E mais, sem noção alguma do que seja construção científica, feriu intelectuais brasileiros, reconhecidos nacional e internacionalmente, dirigindo críticas infundadas a Paulo Freire e Magda Soares. Dizer que Paulo Freire “falhou” em seus estudos sobre alfabetização é um verdadeiro escárnio!

Diante desse fato, o Sr. Jair Bolsonaro comprovou que desconhece completamente  não só os significados e sentidos da alfabetização, como não tem compreensão de todo o processo que a envolve.

Com  informação reducionista  acerca do processo de alfabetização, o Sr. Jair Bolsonaro  desrespeita o acúmulo de conhecimentos pedagógicos ao passar a ideia de que é possível alfabetizar em 6 meses apenas com o uso de um aplicativo. Ele reduz o processo de alfabetizar/letrar a apenas um dos seus aspectos.  Além disso, simplifica as estratégias de alfabetização/letramento, induzindo a população a crer na falsa afirmação de que um jogo mecanicista e repetitivo, pode exercer o papel de um professor alfabetizador.

Com fala inapropriada e informações erradas, esse discurso simplista e equivocado quer fazer crer que a alfabetização é um processo neutro para a cultura da infância. O desconhecimento do Sr. Jair Bolsonaro não lhe permite reconhecer que o Graphogame não abre possibilidades e caminhos diferentes ao usuário, interditando-o a dar progresso ao jogo se “não dominar primeiro a habilidade imposta/tratada”, pautado em uma concepção de ensino behaviorista e massificadora, que enxerga as crianças como peças idênticas de uma engrenagem.

Assim, cidadãos e cidadãs, a  Associação Brasileira de Alfabetização (ABAlf)[1] e a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd – GT10), desde que fora publicada  e implementada a Política Nacional de Alfabetização desse governo, vêm reiteradamente alertando e apontando os diversos equívocos e desmontes que orientam tal política. Mais ainda, têm encaminhado  ao Ministério da Educação demonstração de como corrigir esses equívocos, mas sem sucesso.

O governo rompeu o diálogo com associações, universidades e sistemas de ensino sobre alfabetização, mesmo quando esse diálogo foi demandado. Passou a dialogar com profissionais que não são os responsáveis pela alfabetização das crianças e que não estabelecem pontes diretas com o campo da pedagogia, como fonoaudiólogos, neurocientistas e psicólogos.

No campo da educação, em especial da alfabetização, enumeramos diversos retrocessos:

  1. descontinuidade das políticas de alfabetização, dos avanços científicos e pedagógicos a ela associados, ferindo a liberdade de cátedra, por imposição de apenas uma perspectiva pedagógica e desconsideração da complexidade das práticas e da aprendizagem;

  2. desrespeito aos documentos legais , construídos a partir de acordos coletivos que embasam a alfabetização como a PNE, BNCC, DCNs;

  3. descontinuidade das políticas de formação que abrangiam ações universalizadas com alfabetizadores em todo o território nacional;

  4. impedimento do acesso a livros de literatura, com o fim de políticas do livro como o PNBE;

  5. omissão dos problemas vividos pelas redes, por alfabetizadores , escolas e famílias no tempo do ensino remoto;

  6. rompimento entre alfabetização e letramento, ao mudar radicalmente os critérios de qualidade dos livros para alfabetizar e desconsiderou os pressupostos para análise dos livros que vinham sendo construídos desde 1996;

  7. desestabilização do INEP quando desconsiderou as avaliações da alfabetização realizadas pelo órgão;

  8. desmantelo da política de financiamento para pesquisas do campo da alfabetização, dentre outros desmandos.

A ABAlf e a ANPEd – GT10, como entidades que têm por escopo a preocupação com a alfabetização de crianças, jovens, adultos e idosos, independentemente de qualquer prerrogativa partidária, colocam-se movidas a lembrar da urgência que a democracia e o dialógico se façam mais presentes e que  informações corretas sejam a premissas de quem se coloca como representante de uma nação.   

[1] ABALF, fundada em 2012, é uma organização que tem como objetivo articular, acompanhar e fomentar pesquisas e políticas públicas no campo da alfabetização, agregando a participação de atores e instituições envolvidos com essa temática. Por esse prisma, a ABAlf tem por princípio dialogar e agir junto aos que lutam por uma alfabetização que garanta os direitos de aprendizagens da leitura e da escrita de crianças, jovens, adultos e idosos de nosso país, como forma de exercício de  sua cidadania.