Sobre o FEP - grupo de estudos sobre formação em exercício de professores. PPGE-FACED-UFBA | colaboração de texto

Nosso grupo, registrado no CNPq como FEP - grupo de estudos sobre formação em exercício de professores, para manter a tradição de responder às demandas acadêmicas com produções coletivas sobre Currículo e formação de professores, mostra seu a-com-tecer em 2020: um ano em ensino emergencial remoto. 

Escrito a dezenas de mãos, com modulações e estilos diferentes, assim se mostra nosso informe:

Em fevereiro, quando a pandemia da Covid 19 nos parecia distante, tivemos nosso primeiro encontro (presencial!), para a segunda edição das anuais Conversas de Verão:

O movimento da carga elétrica dos corpos é feita por um núcleo composto por prótons, neutros e elétrons? Quantos elétrons, prótons, nêutrons, ou átomos, ou energias, ou saberes ou orixás movimentamos misturados naquele fim de semana? Conhecer, conhecer o outro e o conhecimento do outro é realmente emocionante! Poderíamos chamar esse episódio de arrepio! Nosso ultimo “se diverte” acadêmico em presença física, foi em março, em Itacimirim, litoral norte da Bahia. Diverte, acadêmico, presença, Itacimirim, e nós. Palavras carregadas de uma experiência intelecto-afetiva intensa, arriscada, divertida e filosófica! Foram três dias em que o FEP fez flutuar sua inteireza e a ousadia de pensar currículo, pensar formação, pensar os modos de pesquisa, pensar seus modos de saber e suas ignorâncias! Foram dias de trazer para a mesa as diversas traduções para as metodologias. Epistemologias, metodologias e diferenças traduzidas em pessoas, uma consciência de corpos e traduções. Sim, traduções! O arrepio é como se fosse a tradução do corpo para a experiência! O arrepio é uma mão levantada pra cima dizendo: é isso! Um ponto da enunciação que conta que o animado fim de semana foi uma rede de sentidos e afetos de um grupo de pesquisa! Entre conversas pedagógicas, formativas e teóricas, caminharam livremente as músicas, as comidas, o humor e a alegria de estar com, ser, querer saber e não saber tanto! E nos intervalos sempre lembrávamos que “uma cerveja antes do almoço é muito bom pra ficar pensando melhor”!  E fomos presentes e nos presenteamos!

Duas reuniões presenciais em março. De repente, a pandemia é uma realidade. Fiquem em casa. Mas nossas reuniões das tardes de quinta-feira seguem. Remotamente. Pelo menos assim uma das líderes que se encontrava em uma Licença Capacitação de três meses na UERJ, no Rio de Janeiro poderia participar.

O Fep é tão especial que temos uma bolsista PIBIC pesquisando nossa dinâmica de reuniões e discussões, ou seja, utilizando o próprio grupo de pesquisa como o campo de investigação. A proposta do projeto é uma observação detalhista, originando uma escrita narrativa com descrição densa do nosso cotidiano. Quando foi pensado esse projeto, nem nos melhores ou piores sonhos, pensamos nessa contingência que está sendo a pandemia. Com reuniões tradicionais feitas em diversos espaços, mais uma vez, o FEP teve que se reinventar, saindo do campo presencial para o presencial virtual. E para a construção da pesquisa, um novo potencial surgiu na nossa frente! Apesar do primeiro semestre ainda estarmos nos ambientando ao novo formato de nos encontrarmos em uma sala virtual, cada qual em seu quadrado literalmente, no segundo semestre vimos a possibilidade de deixar registradas nossas reuniões para a posteridade através de gravações em vídeo. Hoje todas as nossas reuniões são gravadas e arquivadas, e quem sabe um dia, divulgadas para compartilharmos experiências, conhecimento e afeto ao mundo. 

No início de março de 2020, após a integração de Pedro Buarque e Dayany ao Programa de pós-graduação da FACED, foi possível ao FEP tomar contato com potencialidades ainda impensadas do ensino remoto. Tratava-se de novos integrantes num grupo para o qual, até então, o contato constituía uma marca de reciprocidade. Sem presencialidade física: assim era o grupo para eles e eles mesmos para o grupo, uma vez que até então não chegaram a encontrar fisicamente nenhum daqueles ou nenhuma daquelas que, ao longo dos meses, semanalmente, com eles partilhariam as "frituras" e os "pensamentos insones", os deslocamentos e os devires. A falta do tocar e do ser tocado dos abraços - isto é, dos corpos na densa fisicidade da presença de uns diante dos outros -, ou mesmo o conforto da distância propiciada por uma tela que sempre deixa à altura de um click a possibilidade do "desconectar", nada disso fazia de cada encontro um processo menos pregnante de transformação, de um perder-se para logo se reencontrar numa ordem discursiva outra, numa presencialidade outra.

Produtividade e pandemia... SQN (sic). Mas foi impossível não pensar nos impactos que esse período causou em todos nós. Pouco depois da suspensão das atividades presenciais as reuniões do FEP migraram imediatamente para o mundo on-line. Digo as reuniões, porque as discussões sempre estiveram lá “no virtual” através do nosso grupo no whatsapp, sempre repleto de provocações. Num desses momentos de conversas nos chega o meme Isto não é uma escola, uma versão da famosa obra de René Magritte substituindo o cachimbo por um notebook. Compreendemos, que havia um equívoco de interpretação, ainda que a intenção fosse compreensível. O meme era uma crítica e ao mesmo tempo um chamado a resistir às tentativas iniciais das escolas em ofertar a continuidade das aulas no ambiente on-line. Nossa reação foi argumentar sobre decisões e posições sobre a escola, considerando a compreensão de sentidos da complexa indecidibilidade e defendemos possibilidade de que Isto [notebook] pode ser uma escola.

Os chamados ao FEP só conseguem ser atendidos muito criativamente e não poderia ser diferente num misto de pesquisadores professores poetas, bailarinos, desenhistas, influencers, músicos, ativistas... O chamado era participar uma produção conjunta – coisa que se tornou bem frequente para os membros – de uma videoarte que nos mostrasse em movimento para o Congresso Virtual UFBA em Movimento. FEP em Movimento. Gestamos, literalmente, no Movimento Tito em seu mergulho amniótico e parimos uma vastidão de sentidos com a natureza [Para, para]; com um pequeno mundo de uma janela de prédio; das nossas conexões a cabo, wifi, 4g... Hj vai ter escola, nos contou o movimento Marias; fizemos trapaças com as formas de ver a Universidade e a virtualidade; e traímos imagens de escolas, não foi isso Pró Norma?! Nos movimentamos em Som; gritamos nossa balbúrdia nos movimentando em Parcerias e provocando Outros movimentos, geografando, escrevendo, comunicando, interpretando e concluímos num hino de cultura popular de raiz purificada na pimenta fepeana.

No Congresso UFBA em Movimento 2020, também problematizamos o que então conhecíamos como presencialidade na mesa intitulada “Professorxs pesquisadorxs se pensam, pensam a educação e suas pesquisas em cenários de pandemia”, uma conversa entre pesquisadorxs de mestrado, doutorado, pós-doc e sua orientadora em que apareceram desde as angústias referidas a uma possível suspensão dos processos de pesquisa, como também as oportunidades, desafios e deslocamentos que uma pandemia poderia acarretar nas reflexões que transitam especificamente pelas discussões sobre o currículo e a formação de professores. Quisemos expor como, apesar de estarmos reclusos em casa, o grupo FEP em particular, e seus integrantes necessitavam reinventar-se nas possibilidades que nos oferecia a virtualidade, conceito que por sinal, foi amplamente estudado nos nossos encontros de quinta-feira. 

E o FEP foi convidado para, além das inúmeras apresentações de trabalho, coordenação de GTs, participação na organização do evento, assumir a abertura online da Regional NE da ANPED, o XXV EPEN:

[...] propusemos um vídeo com roteiro que, além de todos os participantes, foi protagonizado por balões bastante representativos. Em tempos de pandemia e isolamento social, a presença, além de feita, foi vista, colorida e flutuante. Participantes do evento saiam de suas casas carregando seus balões, cheios de saberes, vivências - inclusive saudades - prontos para uma edição que propunha possibilidades efetivas de outras epistemologias, figurada por balões que transitaram mesmo num tempo de calamidade pública, causada pela pandemia do covid-19. Levamos balões ou fomos levados por eles? E a claquete indicava! Corta para: balões e cabeças chegando na Universidade trazendo consigo as produções, cheios de ar e pensamentos, como diria a alemã estrela do rock dos anos 80 Nina Hagen e seus 99 Luftballons (balões de ar) mais conhecidos na adaptação anglófona como 99 Red Ballons (balões vermelhos). Flutuando, de diversas direções, chegam ao destino independente do vento em condições adversas. Corta para: na abertura, o auditório estava lotado de balões – coloridos, cheios, reunidos e vibrantes – distribuídos pelas cadeiras. Ainda que diante de muitas adversidades, estavam prontos para voar. O que preenchia cada balão? A abertura do XXV EPEN indicava que logo descobriríamos, mas, pelas cores e o fervilhar dos conteúdos, era algo que voaria longe e conectaria saberes, que mesmo separados, de isolados não tinham nada!

E como a literatura não fica de fora...

Castelo ou taberna? Calvino nos perguntou, numa quinta-feira à tarde. Interpretações e reflexões com cartas postas neste castelo sublime. Um desafio narrativo nos invadiu na pandemia, O Castelo dos Destinos Cruzados, de Ítalo Calvino; uma narrativa com uma rede de interpretações, ampla e sugestiva. Um livro já escrito ou histórias que se constroem com a leitura? A escrita narrada em 12 contos, com cenários compostos, cada um deles compondo uma essência diferente com novas formas na mesma obra. Os elementos fornecidos pela obra literária permitem que o leitor tenha autonomia para lê-la. Com nosso estilo fepeano, decidimos aproveitar esse texto icônico e compartilhar nossa leitura sobre este livro; cada um escolheu uma história e fez com ela o que quis: leitura de um trecho, interpretação a partir de uma carta, exposição do que achou etc. A leitura começou com uma introdução sobre o tarô e depois nos concentramos em cada uma das histórias que apareceriam no livro. Em nossa conversa sobre e com o texto encontramos elementos que o autor privilegia, concede ao leitor interpretar sua obra, de forma indefinida e ambígua. Ao final, não foi uma obra que terminou em sintonizações em uníssono, foi um texto de leitura e narrativas polifônicas.

Gente do mestrado, graduação, doutorado, orientadoras participantes do FEP - grupo de estudos sobre formação em exercício de professores. PPGE-FACED-UFBA. 

Salvador, 10 de dezembro de 2020.