O ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), Gilberto Kassab, publicou neste domingo, 27 maio, um artigo no Jornal do Brasil fazendo um balanço dos dois anos da fusão das pastas de Ciência, Tecnologia e Inovação com a das Comunicações. O artigo pode ser lido aqui.
Os presidentes da Sociedade Brasileira Para o Progresso da Ciência (SBPC), Ildeu de Castro Moreira, e da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Luiz Davidovich, que desde a notícia da fusão advertem para os prejuízos da decisão para o desenvolvimento da ciência e tecnologia no País, comentam o artigo.
Moreira aponta que, apesar de convergências de opiniões, especialmente sobre a necessidade de ampliar os recursos para a área, a comunidade científica tem interpretações diversas sobre os pontos levantados por Kassab. “O ministro Gilberto Kassab trata, em seu texto no JB, dos dois anos da fusão dos ministérios da CT&I e das Comunicações, que resultou no atual MCTIC. Ele tenta demonstrar o acerto da iniciativa, alinhavando alguns pontos que considera como resultados positivos desta fusão. O ministro acertadamente reconhece que ‘processos governamentais, gestão e implementação de políticas públicas são temas expostos a múltiplas interpretações e pontos de vista. Isso vale para qualquer nível de governo e é um elemento dos mais saudáveis da democracia…’. É o caso aqui. Entendemos que a democracia é um elemento essencial para a sociedade brasileira e ela deve acolher os diversos pontos de vista, divergentes ou não. Temos interpretações diversas sobre este e outros pontos, e também convergências sobre a necessidade de termos mais recursos para a CT&I e nos empenharmos coletivamente nesta direção”, ressalta.
Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), salienta que tem sido intensa a mobilização do ministro Kassab para conseguir mais recursos para o MCTIC, que realmente está muito afetado pelos cortes que ameaçam a sobrevivência da ciência no Brasil, porém a junção dos ministérios, segundo ele, prejudicou o sistema de CT&I. “Em primeiro lugar, eu reconheço os esforços do ministro em procurar aumentar o orçamento do seu Ministério, beneficiando, assim, a ciência do Brasil. Por outro lado, desde o início nós fomos contra essa restruturação que juntou o Ministério da CT&I com o das Comunicações. E continuamos achando que essa junção não ajuda o sistema. Por exemplo, não consigo ver a conexão entre a Empresa de Correios e Telégrafos e o CNPQ e a Finep. É preciso ressaltar, também, que esses órgãos, que antes tinham uma posição de destaque dentro do Ministério, baixaram nessa hierarquia. Um grande número de organizações passou a fazer parte do MCTIC, o que prejudica a atividade da Pasta em defesa da ciência e tecnologia”, argumenta o presidente da ABC.
O presidente da ABC lembra ainda da importância de o Ministério insistir para que o Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT) seja convocado com mais frequência – a ultima reunião foi em novembro de 2016. “Nós gostaríamos que essa frequência de reuniões fosse aumentada, uma vez que ele é o órgão por excelência que pode articular as funções dos vários ministérios com a área de ciência e inovação tecnológica. Temos vários ministérios que podem contribuir para isso. E o fórum adequado é o CNCT, que permite um contato direto entre representantes de comunidade científica, de empresas inovadoras, com os ministérios da Fazenda e do Planejamento, que evidentemente são órgãos importantíssimos nessa questão”, afirma Davidovich.
Ildeu de Castro Moreira reitera que a SBPC se manifestou desde o início contrariamente a esta fusão por razões variadas, algumas das quais mencionadas pelo professor Luiz Davidovich, e que estão em diversas manifestações da entidade, como a “Carta de Pernambuco”, publicada no dia 21 de maio – o primeiro documento resultante do ciclo de seminários temáticos “Políticas públicas para o Brasil que queremos” que a SBPC realiza neste semestre, que apresentou 12 propostas para políticas de CT&I no Brasil. “A Carta de Pernambuco, que traz algumas das principais propostas de políticas públicas para CT&I da SBPC, e que serão levadas aos candidatos presidenciáveis, está reafirmada esta posição: ‘A recriação do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação inteiramente destinado a esta área’. Isto significa que não apenas houve resistência da comunidade científica a esta fusão, mas que ela prossegue porque entendemos que a medida foi e é prejudicial ao Sistema Nacional de CT&I. Quanto ao Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia, como mencionado pelo presidente da ABC, as nossas entidades representativas da comunidade científica e acadêmica solicitaram já, em 2017 e por diversas vezes, a convocação do CCT pleno, que não ocorre desde o final de 2016, para discutir a situação da área em face dos cortes drásticos nos recursos para CT&I. As reuniões do CCT Consultivo do MCTIC têm ocorrido com frequência, mas elas não têm nem o papel e nem a influência do órgão maior de articulação das políticas de CT&I. As iniciativas tomadas pelo MCTIC, e potencialmente positivas, de criação de novas estruturas, como é o caso do Coordenação-Geral de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, padecem das fortes restrições orçamentárias, assim como estruturas anteriores, também relevantes, que foram extintas ou reduzidas em sua capacidade operacional em função dos cortes”, comenta o presidente da SBPC.
Moreira destaca que o empenho dos gestores do MCTIC na luta por mais recursos junto às áreas econômicas, ao núcleo de decisões do governo federal e ao Congresso Nacional deve ser reconhecido. Bem como, acrescenta ele, muitas vezes as entidades científicas e o MCTIC estiveram juntos em ações junto ao parlamento.
“Mas o MCTIC é a representação oficial do governo federal junto à comunidade científica e tecnológica e o responsável maior pela execução das políticas governamentais nesta área. Por isto, a permanente atuação crítica das entidades cientificas junto a ele, e aos demais setores do governo e ao parlamento, para que seja revertido o atual quadro de acentuado retrocesso no apoio à ciência e tecnologia (e a outras áreas, como a educação pública). Como diz o ministro Kassab, e estamos de acordo, é preciso seguir nesta luta por mais recursos para CT&I”, declara Moreira. “Acrescentemos que nossa luta se desdobra ainda mais, para que tenhamos condições de fato favoráveis ao desenvolvimento da ciência brasileira; que ela passa por recursos orçamentários adequados e seu não contingenciamento, pela preservação do Sistema Nacional de CT&I e por um projeto de nação com desenvolvimento sustentável e com soberania. Prosseguiremos nesta luta”, conclui.