No ano de 2015, vários movimentos pautaram a mídia, tanto hegemônica quanto contra-hegemônica. O golpe, as ocupações, debates sobre gênero e feminismo foram temas que reforçaram a polarização de discursos de direita e esquerda.
O debate sobre gênero na educação suscita diversas tentativas políticas de intervenção na educação, como a retirada do tema do Plano Nacional de Educação. Outra proposição nesse sentido é o Movimento Escola Sem Partido, que em 2014 inspirou projetos de lei e, neste ano de 2016, em Alagoas, de forma inédita entre os estados da União passou a proibir o professor de emitir opinião em sala de aula - clique aqui para entender mais sobre o Escola sem Partido.
As reportagens, de maneira geral, trazem um representante do movimento do ESP, em sua maioria o autor do projeto, Miguel Nagib, ou algum político responsável pelo PL, e um representante contrário, em sua maioria professores - Fernando Penna, historiador e professor de educação na UFF, foi diversas vezes acionado pela mídia. Como exemplo da reportagem do portal Terra e do portal O Dia, o programa Sala Debate, do Canal Futura, também recebeu Nagib e Penna no dia 19 de julho deste ano.
Fernando Penna e Miguel Nagib foram entrevistados por José Brito Cunha no Programa Sala Debate Canal Futura
Como podemos perceber, tais reportagens apenas apresentam os pontos a favor e contra o projeto, não buscando expor contradições, comparações e informações importantes sobre a biografia dos autores do PL e do movimento contrário. Miguel Nagib e os autores do PL não são educadores ou pessoas da área, enquanto o movimento de contestação é majoritariamente formado por docentes tanto do ensino básico quanto do superior, estes não convidados a participar da formulação do projeto.
Lula Vilar, em no site Cada Minuto, escreveu um artigo defendendo o Escola sem Partido, refutando algumas alegações do movimento contrário e enfatizando a necessidade de respeitar pensamentos diferentes. O autor se concentra em justificar o projeto apenas a partir dos artigos do projeto, mas deixa de analisar sua construção a partir de um contexto social e histórico, como Fernando Penna ressalta no debate no Canal Futura com Nagib. Vilar também deixa de refletir sobre trechos “vagos”, como o item sete do Art. 1º: “direito dos pais a que seus filhos menores recebam a educação moral livre de doutrinação política, religiosa ou ideológica”.
Outro aspecto que a mídia pouco procura questionar são dados sobre a educação e a relação com os partidos políticos. Em entrevista à rádio EBC, Nagib foi perguntado sobre o tema, mas o criador do movimento declarou que não há dados que comprovem essa situação de “chamada partidária”. O portal da revista Nova Escola também produziu uma reportagem interessante que analisa algumas afirmações nas quais o movimento se apoia, como doutrinação, "exército de professores militantes", pluralismo de ideias nas escolas.
A comunicação da Escola Politécnica Joaquim Venâncio fez uma reportagem em que ressalta que o ESP se apoia em uma pesquisa realizada em 2008 pelo Instituto Sensus, a pedido da Revista Veja, que gerou muita controversa.
Atualmente o tema tem ganhado grande visiblidade midiática - a consulta pública realizada pelo site do senado federal sobre o PL recebeu número recorde de respostas. Sites jornalísticos como G1, O Globo, A Tarde, Brasil de Fato e Educação UOL noticiaram o caso com regularidade. Também ganhou repercussão o momento em que o Ministério Público Federal encaminhou nota em que afirmava a inconstitucionalidade do projeto de lei 867/2015. Os portais G1, Estadao, UOL e Agência Brasil noticiaram o caso.
Imagem do site: https://www12.senado.leg.br/ecidadania/visualizacaomateria?id=125666
No segundo semestre de 2015, o movimento passou a ter uma entrada mais frequente na mídia com a tramitação de projetos semelhantes em diferentes estados, como o PL Alagoano, intitulado Escola Livre, de Ricardo Nezinho, que foi sansionado por unanimidade pela câmara dos Assembleia Legislativa do estado. A partir de janeiro até o projeto ser sancionado em Alagoas, em abril deste ano, inúmeras matérias e entrevistas circularam na mídia reforçando ainda mais a polarização política.
O tema também foi pautado na mídia a partir de confusões durante audiências públicas sobre os PL. Uma delas, no dia 3 de dezembro de 2015 na ALERJ, contou com a presença de uma pessoa pró Escola Sem Partido fantasiada do ditador alemão Adolph Hitler. Outro caso semelhante ocorreu na audiência realizada no dia 30 de junho de 2016, quando foram ouvidos gritos de manifestantes saudosos ao general Ustra, que torturou a presidenta Dilma e mais 500 pessoas,. Os casos foram citados na reportagem do G1 e no site Brasil de Fato.
Outro momento em que a mídia trouxe o debate foi quando o atual Ministro da Educação, Mendonça Filho, se reuniu com Alexandre Frota, ex-ator pornô, e o fundador do grupo Revoltados Online, o ex-pastor Marcello Reis. O caso teve ampla repercussão e o site Lupa, da Revista Piauí, fez uma reportagem a respeito, desmistificando alegações de Frota sobre a agenda de conversas.
Imagem do site: http://piaui.folha.uol.com.br/lupa/2016/06/23/as-propostas-alexandre-fro...
A difusão do tema na imprensa também ganhou fôlego com a nomeação de Adolfo Sachsida, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), como assessor especial do MEC. Declaradamente defensor do Escola Sem Partido, Sachsida foi exonerado do cargo antes mesmo de ser empossado. Sites de notícia como o Estadão, a Revista Fórum, a Nova Escola e o G1 também noticiaram o caso, porém deixando de trazer a posição do movimento contrário ao Escola Sem Partido, apenas destacando as premissas do projeto.
A partir das reportagens divulgadas acerca do tema percebe-se que a mídia se concentra em expor os dois lados da história. Em um primeiro momento isso se mostra justo e correto para meios de comunicação informativos, contudo é possível verificar que essa abordagem, na realidade, se estrutura de forma simplificada e rasa. É necessário não ignorar a complexidade de um assunto extremamente importante que atinge diretamente a formação política, social e analítica da população brasileira.
Analisar o contexto histórico da criação do movimento é extremamente importante, os atores em jogo na construção tanto do PL quanto do movimento de resistência. Nesse aspecto, vale ressaltar, não é apenas colocar o nome e cargo do entrevistado - mas expor sua história de atuação política.
Reportagem: Camilla Shaw | estagiária de comunicação da ANPEd
Supervisão de estágio: João Marcos Veiga (jornalista responsável) e Paulo Carrano (primeiro-secretário da ANPEd)