A ANPEd finalizou nesta terça-feira, 06 de junho, na Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, o ciclo de seminários “Ensino Médio - o que as pesquisas têm a dizer?”, realizados nas cinco regiões do país. As atividades ocorreram no contexto da consulta pública do MEC sobre o tema - a escuta foi prorrogada em um mês e estará aberta até o dia 06 de julho através de plataforma online de participação.
A série de seminários foi acolhida em universidades públicas com o intuito de fomentar um debate qualificado a partir de estudos da área. As atividades mobilizaram faculdades de educação, programas de pós-graduação, docentes e discentes de instituições de Vitória da Conquista (UESB), Curitiba (UFPR), Manaus (UEA), Rio de Janeiro (UNIRIO) e Brasília (UnB), De forma geral, as diferentes perspectivas trazidas nos encontros ao longo de dois meses expuseram críticas à reforma empreendida desde 2017, trazendo prejuízos a alunos e ao cotidiano escolar.
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A ANPEd fará uma relatoria colhendo os principais pontos levantados pelos pesquisadores, além da indicação de produções acadêmicas - somente no âmbito dos 23 Grupos de Trabalho da Associação, foram identificadas mais de 150 pesquisas sobre o tema. O Ministério da Educação esteve presente em todos os encontros como observador.
A presidenta da ANPEd, Geovana Lunardi, agradeceu a escuta atenta do MEC e da Secretaria de Educação Básica, através de Alexsandro Santos, diretor de Políticas e Diretrizes da Educação Integral Básica (SEB/MEC), e Valdirere Alves de Oliveira, coordenadora geral de Ensino Médio, que estiveram presentes ao longo do ciclo de debates. “Essa escuta, que estabelece o diálogo, é algo que fez muita falta nos últimos seis anos, inclusive para que as políticas públicas possam representar de fato tudo aquilo que a área evidencia através da produção acadêmica". Segundo Lunardi, a expectativa é que o conteúdo das mesas e as pesquisas levantadas a partir dos seminários sejam entregues ao MEC, ao ministro Camilo Santana, mas também “que também circule por nossa comunidade científica e sociedade em geral”.
Miriam Fábia Alves, integrante da diretoria ANPEd Mais Presente, pontuou como os cinco seminários expuseram uma pluralidade de vozes e deixaram consensos claros: a necessidade de revogação do Novo Ensino Médio, incluindo o arcabouço legal que o sustenta, como a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e novas políticas de livro didático e formação de professores. “Não é esse o ensino médio que os jovens querem. E as implicações não só no ensino médio, mas atacam o conceito básico de educação básica e de formação previstos na legislação”, argumentou. Segundo Alves, que é docente da UFG, a promessa de itinerários formativos não se formalizou, com fragilidade conceitual, descompasso e descontinuidade de implementação em tempos pandêmicos e no atual contexto.
Segundo Fabiany de Cássia Tavares Alves, vice-presidente da ANPEd pela região Centro-Oeste, existe uma fragmentação curricular e uma falta de discussão quanto à equidade e a justiça social no léxico de reformas. “A juventude não participa da discussão, colocada à margem do processo. Qual capacidade de inserção a partir desses itinerários formativos?", questiona. De acordo com a professora, “há no todo uma reclamação pela revogação e pelo conhecimento do que dizem as pesquisas. É algo que as pessoas querem ouvir. E esses cinco seminários comprovam isso pela sua audiência, mas acima de tudo por aquilo que nós trouxemos", pontou.
Centro-Oeste e juventudes
A mesa formada para o encontro Centro-Oeste trouxe um olhar especial sobre as juventudes. Wivian Weller, que coordena há quase 20 anos o GERAJU, Grupo de Pesquisa da UnB Gerações e Juventude, apresentou instigantes escutas quantitativas e qualitativas com alunos sobre percepções diversas, incluindo os componentes curriculares. Os dados coletados e analisados mostraram o quanto estudantes valorizam disciplinas deixadas de fora no Novo Ensino Médio e o quanto desejam a presença constante de disciplinas como música e artes.
Luciano Rodrigues Duarte (IFMS) fez explanação sobre histórico de reformas e também trouxe a experiência do cotidiano como professor. Segundo ele, com 85% dos jovens brasileiros matriculados em escolas públicas, existe um grande contingente destes que trabalham em contraturno pra sustentarem as famílias. Com a retirada de 600 horas de formação básica, desvalorizando disciplinas como história, geografia e filosofia, a formação humana passa a ser comprometida seriamente. “O documentos têm que trazer as juventudes reais, com diversidade, sem padronização da juventude. E estamos diante de itinerários que as escolas não têm condições de ofertar. Enfraquece o sentido do Ensino Médio, que passa a ser um privilégio”.
Klever Corrente Silva, membro da Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEDEF) lembrou que currículos precisam expressar projetos de vida. “Dentro dos nossos currículos precisa constar essa diversidade e subjetividades. As questões sociais precisam permear nossas discussões dentro de sala de aula e a construção de tais projetos nacionais”. Para ele, é preciso criar instrumentos capazes de materializar uma real transformação, para que cidadãs e cidadãos possam fazer uma leitura crítica da realidade, enaltecendo, assim, a importância da escuta à pesquisa e aos professores.
Miriam Alves também abordou questões históricas do estado de Goiás, com preocupante militarização das escolas empreendida nos últimos anos e onde mais da metade dos 246 municípios só possui uma única escola, jogando por água possibilidades de itinerários. Além disso, a pesquisadora pontuou que “a reforma não resolve os problemas históricos da Educação, como infraestrutura e carreira docente. "Essa reforma do NEM vem com um conjunto de outros ataques à escola pública. Se queríamos flexibilização, estamos vendo um esfacelamento do ponto de vista histórico", argumentou.