Nota de repúdio à Lei Nº 8.242/16
Para o prefeito Alcides Bernal e todos/as os/as vereadores/as da cidade de Campo Grande, MS.
Nós, professores/as pesquisadores/as, do Programa de Pós Graduação em Educação do Campus Pantanal, do Programa de Pós Graduação em Educação de Campo Grande e do Programa de Pós-graduação em Ensino de Ciências, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), repudiamos a aprovação da Lei Nº 8.242/16, pelos motivos expressos abaixo:
A Lei Nº 8.242/16 é desnecessária. Já existem legislações e processos de denúncias que são conhecidos por pais, mães, alunos/as e comunidade escolar que buscam evitar e responsabilizar possíveis excessos do trabalho docente em sala de aula no que se refere ao ensino de temáticas em torno do gênero, da sexualidade, da religião e da política.
A Lei Nº 8.242/16 confronta e desrespeita outras legislações, como por exemplo: a Carta Magna do país (Constituição Federal), a Lei 8069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA), a Lei Federal nº 12852/2013 (Estatuto da Juventude), a Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB) e a Lei nº 13.005/14 (Plano Nacional de Educação). Está, inclusive, em contradição com os pressupostos já aprovados no Plano Municipal de Educação de Campo Grande (MS).
A Lei Nº 8.242/16 é anti-científica. Ela retira do conteúdo do currículo escolar temas relevantes decorrentes de estudos e pesquisas científicas, como se fossem falsas interpretações da realidade (nas palavras dos/as seus/suas defensores/as, “ideologia”).
A Lei Nº 8.242/16 desconsidera os acordos internacionais, assumidos pelo país, desde o início do século XX, que visam a garantia dos Direitos Humanos, para a diminuição das desigualdades entre homens e mulheres, tanto no campo científico-profissional, como no campo das relações interpessoais em diferentes espaços.
A Lei Nº 8.242/16 é injusta quando leva a escola a omitir experiências de violência religiosa que marcam a história do nosso país. Sabemos que se as questões religiosas, em seus aspectos filosóficos, sociológicos, antropológicos e históricos não puderem ser ensinadas e debatidas criticamente na escola, os/as alunos/as não terão acesso a uma formação que os/as possibilite reverter a compreensão preconceituosa e etnocêntrica dos “pseudos” valores religiosos que seguem mantendo desigualdades e injustiças sociais.
A Lei Nº 8.242/16 desprotege e contribui para a vulnerabilidade de crianças e adolescentes. Vários/as alunos/as, infelizmente, têm sido desrespeitados/as e agredidos/as em âmbito familiar diante de temas como gênero, sexualidade, religião, e têm buscado na escola informação e espaço de acolhida e proteção. Caso os/as professores/as, devidamente capacitados/as, não abordem essas temáticas, dificilmente construirão o vínculo necessário com os/as alunos/as para contribuir com o enfrentamento dessas violências, inclusive para acessar a rede de proteção das crianças e dos/as adolescentes.
A Lei Nº 8.242/16 é anti-democrática. Ensinar sobre democracia e direitos sem que os/as alunos/as possam se motivar a valorizar a importância e, até mesmo, a participação em manifestações e passeatas, significa amordaçar/as os professores/as diante dos incontestáveis fatos históricos que mostram o valor das manifestações político-democráticas no Brasil, inclusive para que hoje os próprios direitos das crianças e dos/as adolescentes existissem.
Diante das justificativas, somos veementemente contrários/as a aprovação desta lei e pedimos que ela seja vetada.
Campo Grande, MS, 15 de abril de 2016.
Professores/as pesquisadore/as do Programa de Pós-Graduação em Educação do Campus Pantanal, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
Professores/as pesquisadore/as do Programa de Pós-Graduação em Educação de Campo Grande, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
Professores/as pesquisadore/as do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.