Manifesto GT 07 | Avaliação da Educação Infantil e a nova portaria da Política Nacional de Avaliação da Educação Básica: indefinições e riscos

A Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), por meio do Grupo de Trabalho “Educação de Crianças de 0 a 6 anos”, manifesta seu repúdio a quaisquer iniciativas de avaliação em larga escala das crianças matriculadas na Educação Infantil, por meio de instrumentos que visem aferir domínio de competências e habilidades.

Assim, alerta para os riscos da recente Portaria publicada pelo Ministério da Educação (Portaria nº 458, de 5 de maio de 2020), que institui normas complementares necessárias ao cumprimento da Política Nacional de Avaliação da Educação Básica, para a Educação Infantil.

A referida Portaria, ao estabelecer normas relativas ao Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), adequadamente abrange todas as etapas que compõem a Educação Básica: a Educação Infantil; o Ensino Fundamental e o Ensino Médio. No entanto, em relação à Educação Infantil não há qualquer inciso que explicite como esta deverá ocorrer e, portanto, não demarca atributos concernentes a essa etapa educacional e à sua avaliação no âmbito das políticas públicas de educação.

A ausência de dispositivos que definam o delineamento da avaliação na Educação Infantil pode resultar em proposições que desconsiderem as concepções de Educação Infantil e de avaliação presentes: i) na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei n.9394/96), ii) nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil (DCNEI - Resolução CNE/CEB nº 5/2009), que tem como eixos estruturantes do currículo desta etapa as interações e a brincadeira, por meio das quais as crianças constroem e apropriam-se de conhecimentos e iii) no Plano Nacional de Educação (Lei n° 13.005/2014), que prevê avaliação das condições de oferta da Educação Infantil.

Em que pese os esforços para melhoria das condições de acesso e oferta da Educação Infantil no país, são ainda precárias e desiguais as condições estruturais vigentes nas creches e pré-escolas, as quais condicionam, de modo determinante, a qualidade da educação ofertada às crianças. Destaca-se, ainda, que às desigualdades presentes entre os sistemas educacionais e no interior destes somam-se desigualdades sociais, que se refletem na concretização do direito à educação de qualidade para todas as crianças.

Caso venha a se aplicar à Educação Infantil o que normatiza a Portaria nº 458/2020, ao estabelecer que o Saeb “será realizado anualmente, com caráter censitário, tendo como objetivo aferir o domínio das competências e das habilidades esperadas ao longo da educação básica, de acordo com a Base Nacional Comum Curricular - BNCC e as correspondentes diretrizes curriculares nacionais”, provavelmente as crianças que não se saírem bem nessa avaliação serão culpabilizadas pelo seu fracasso, bem como os seus professores e as suas professoras. Acrescenta-se o fato de que a abstração das condições estruturais de sua produção pode interferir na consequente rotulação e estigmatização das mesmas, a exemplo do que estudos e pesquisas têm demonstrado, ao longo dos anos, em relação às demais etapas da educação básica. Além disso, encaminhamento dessa natureza contraria frontalmente todas as normativas vigentes relativas à Educação Infantil.

Em conclusão, a Anped considera inaceitável qualquer perspectiva de adoção de uma avaliação em larga escala de competências e habilidades de crianças, em creches e pré-escolas, no âmbito do Saeb, uma vez que o objetivo maior da Educação Infantil, conforme consta na LDB, é o desenvolvimento integral das crianças. Esse processo não acontece de forma homogênea entre as crianças. Portanto, a Anped solicita que o MEC dê continuidade, por meio do Inep, às proposições de avaliação da oferta e do acesso à Educação Infantil que vinham sendo construídas em diálogo com pesquisadores e pesquisadoras e representantes de movimentos sociais da área, que resultaram em uma primeira iniciativa, realizada em 2019, no levantamento de informações, por meio de questionários contextuais, aplicados em caráter amostral, a dirigentes das secretarias e de instituições de Educação Infantil, bem como aos professores e às professoras que nelas atuam.

 

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