Abertura do evento, realizado após 33 meses desde o último encontro presencial em função da pandemia, também trouxe panorama da Avaliação Quadrienal e um olhar histórico e social sobre as efemérides de 200 anos da Independência do Brasil e 100 anos da Semana de Arte Moderna
texto e fotos: João Marcos Veiga/ANPEd
O Fórum dos Coordenadores de Programas de Pós-Graduação em Educação (FORPREd) realizou nos dias 01 e 02 de agosto reunião na Universidade Federal de Brasília (UnB). Este foi o primeiro encontro presencial em quase três anos, desde o início da pandemia. A participação superou as expectativas, com representantes de 114 PPGEs das cinco regiões do país e com todos lugares do auditório Dois Candangos, da Faculdade de Educação, tomados na abertura das atividades.
A mesa de abertura contou com a presença da presidenta da ANPEd, Geovana Lunardi, do coordenador e vice do FORPREd Nacional, Marcelo Soares (UFU) e Alice Botler (UFPE), da coordenadora do PPGE da UnB, Cláudia Pato, do decano de Pós-Graduação da UnB, Lúcio Remuzat Rennó Junior, e da coordenadora do PPGE – Modalidade Profissional da UNB, Girlene Ribeiro de Jesus. Todos presentes saudaram o espaço histórico de realização do evento e a oportunidade única para a formulação de uma proposta coletiva de reconstrução de parâmetros para a pós-graduação brasileira. A solenidade foi conduzida pela Primeira Secretária da Associação, Maria Beatriz Luce (UFRGS).
Avaliação quadrienal dos programas
Na conferência de abertura dos trabalhos, Ângelo Souza (UFPR), representante da área na Capes junto a Robert Verhine (UFBA), abordou o contexto da avaliação quadrienal da pós-graduação, trazendo dados do último relatório, próximos passos e perspectivas.
No último quadriênio, foram avaliados 110 mil itens da área de Educação, sendo validados 14 mil produtos (85% artigos, 5% livros autorais, 10% capítulos de livros e 5% produtos técnicos). O predominância de artigos, publicados em mais de 4 mil periódicos do Brasil e exterior, indica, segundo Souza, a tendência acertada dos programas em apresentarem produtos de maior impacto para avaliação.
Souza lembrou que não só a pandemia, mas também o processo recente de judicialização pelo Ministério Público trouxe atrasos e inseguranças - leia artigo dos coordenadores de área sobre o contexto. No entanto, buscou tranquilizar os presentes quanto à próxima etapa, que deve manter os mesmos parâmetros do quadriênio passado. O Conselho Técnico Científico (CTC) da Capes inicia neste momento reunião de três semanas na qual serão avaliados os 187 programas da Educação de um total de 4 mil, considerando todas as áreas do conhecimento. O resultado preliminar será divulgado em agosto, com fase de recursos em setembro e resultado final em dezembro (a depender da judicialização). Ainda em setembro a atual coordenação fará uma reunião com os programas para debater os resultados. Ao final da conferência, Ângelo Souza tirou dúvidas de representantes de programas
A atual representação da Educação na Capes, que encerra sua gestão em dezembro, teve como marca o amplo diálogo com a área. Além do Seminário de Coordenadores em 2019 e Seminário de Meio Termo, foram promovidos dez webinários e produzidos materiais didáticos como FAQs. Souza destaca que a primeira versão do relatório foi disponibilizada aos programas ainda em dezembro de 2019 - um ano e meio antes do preenchimento da plataforma de avaliação.
“Sabemos da qualidade da nossa área. Uma das intenções aqui é construirmos parâmetros coletivos, a partir da experiência da área”, afirmou Souza, destacando desafios à próxima gestão em torno de quesitos como impacto, assim como de revisão de critérios e simplificação de indicadores.
Independências
A mesa de abertura, com coordenação de Maria do Socorro Alencar (UFSJ), também contou com apresentação de Luciano Mendes (UFMG). O pesquisador abriu sua fala lembrando os 60 anos da UnB, instituição que representa a invenção de uma universidade menos catedrática e mais amparada na pesquisa, extensão e participação social. “Por outro lado, a UnB também corporificou as mazelas do país, com intervenção, prisões e banimentos a partir da ditadura militar de 1964.” Por isso, Mendes defendeu a necessidade de revisitar a história para repensar o presente.
Para além de ufanismos, os 200 anos da Independência do Brasil, celebrados em 2022, apresentam-se como oportunidade essencial para trazer um olhar sobre os excluídos e invisibilizados do país. Outra efeméride, os 100 anos da Semana de Arte Moderna de 1922 permitem igualmente relembrar um país que vivenciava poucos anos antes uma pandemia que impactou os mais pobres, com fechamento de escolas e mortes. Olhando para o presente, Luciano Mendes relembra as mais de 700 mil mortes causadas pela pandemia de Covid-19. “Mais de meio milhão destas não precisavam ter morrido caso tivéssemos uma política nacional.” Nesse sentido, pontuou que o futuro da pós-graduação, tema do encontro, passa necessariamente por questões de vida, morte, desigualdades e invisibilidades.
O pesquisador da UFMG também frisou a correlação de forças que discrimina a Educação, mesmo sendo esta a maior área, subjugada a uma hegemonia de outros campos que impõem modos de avaliação. “Existem questões epistemológicas de expor o conhecimento que precisam ser respeitadas para além da primazia dos artigos, como os livros da Educação.” A disputa do PNPG nasce, explica, dentro desse contexto. Por fim, fez a defesa de uma maior aproximação com a educação básica e da expansão e valorização de revistas de divulgação científica.
Construindo o Plano Nacional de Pós-Graduação
O FORPREd, junto à diretoria da ANPEd, organizou nos meses de junho e julho um ciclo de 5 seminários abordando temáticas em torno do Plano Nacional de Pós-Graduação como financiamento, os programas profissionais, a Educação à Distância (EAD) e uma análise da conjuntura política. “E agora no encontro do Fórum trouxemos uma discussão da avaliação quadrienal na pós-graduação e fomentamos espaços presenciais tendo como horizonte produzir subsídios da Educação para o documento”, explica Marcelo Soares (UFU), coordenador do FORPREd.
Para tal, os presentes foram divididos em seis eixos: Financiamento, EAD, Inserção Social, Internacionalização, Ações Afirmativas e Auto-Avaliação/Planejamento. As reuniões realizadas nas instalações da Faculdade de Educação da UnB trouxeram acúmulos de debates e experiências e as sínteses foram levadas à plenária final no auditório Dois Candangos. Dentre os diversos pontos, que serão sistematizados num documento, é possível destacar:
Ações afirmativas: indução e garantia de cotas; normatização nas universidades para todos programas; garantia de bolsas para discentes cotistas; acolhimento contra discriminações; reconhecimento deste quesito nas fichas de avaliação.
Internacionalização: quebra de barreiras entre programas acadêmicos e profissionais; desenvolvimento de parcerias; programas para além do Print Capes; ações Sul-Sul; solidariedade e cooperação como parâmetros.
Impacto e Inserção Social: garantia de redes com financiamento; promoção de ciclos formativos e de debates; observação da regionalidade; valorização não só de produtos, mas também de processos; políticas para educação básica reconhecidas em indicadores de avaliação.
EAD: diferenciação para o ensino híbrido e remoto a partir de diretrizes já aprovadas; Educação à Distância não como expansão e massificação, mas amparada na interiorização, capilaridade, qualificação e inclusão.
Auto-avaliação e Planejamento: dar protagonismo aos programas e reduzir indução da Capes; valorização da dimensão pedagógica da avaliação e não como premiação e punição; integração com redes públicas; criação de indicadores diferenciados que evidenciem as assimetrias entre programas e regiões.
Além do debate referente ao PNPG e à Avaliação Quadrienal, o encontro do FORPREd na UnB também contou com reuniões dos fóruns Centro-Oeste, Nordeste, Norte, Sudeste e Sul, aprofundando detalhes da realização das Reuniões Científicas Regionais que ocorrem este ano em diferentes formatos entre o presencial, híbrido e online.
UnB 60 anos e solidariedade entre programas
A Reunião do FORPREd foi realizada no histórico auditório onde Darcy Ribeiro inaugurou há exatos 60 anos a Universidade de Brasília, sob os pilares de uma educação plural, pública e democrática. A coordenadora do PPGE da instituição, Cláudia Pato, também lembra a efeméride de 50 anos da criação da Faculdade de Educação. Prata da casa, com formação da graduação ao doutorado na instituição, a pesquisadora enaltece o caráter histórico, materializando os valores do antropólogo e igualmente a força que confere ao momento atual.
“Para gente é uma alegria enorme receber um evento de grande porte como esse, com tanto calor afetivo depois da pandemia, que trouxe desafios, inseguranças, enfrentamentos e perdas. A oportunidade de encontro presencial é especialmente gratificante. Alimenta a alma”, comemora a pesquisadora. Segundo ela, o PPGE da UnB segue olhando para o futuro, tendo inaugurado recentemente o doutorado interinstitucional com a Universidade Federal de Montes Claros, dando apoio a uma instituição com menos tradição, além da acolhida em 2022 a alunos de Moçambique e a eventos importantes como o FORPREd.
Alvanize Valente Fernandes Ferenc, coordenadora do PPGE da Universidade Federal de Viçosa, vê no encontro um espaço de múltiplas aprendizagens, sobretudo num momento de muitas dúvidas para os programas, no planejamento para a avaliação, e igualmente de cortes para a área de forma geral. O programa, nota 3, perdeu todas suas 16 bolsas Capes em contingenciamentos recentes. Segundo a professora, contar com a experiência de programas com longa trajetória traz apoio e inspiração, deixando de lado o caráter de concorrência que muitas vezes pauta o ensino superior. “Nossa luta é por reconhecimento da pesquisa que realizamos”. Alvanize destaca a importância do PPGE da UFV para o desenvolvimento profissional de professores da Zona da Mata mineira. “É uma inserção social muito forte e ligada ao nosso entorno. “Mesmo com todas perdas, seguimos produzindo pesquisa e temos certeza que colaboramos efetivamente para a educação com grande impacto social”.
Um dos principais exemplos desse impacto são os programas profissionais, igualmente presentes dentre os associados institucionais da ANPEd. Coordenador do Programa Profissional da Universidade Federal do Tocantins, Damião Rocha explica que eles se diferenciam e se destacam exatamente pela inserção na Educação Básica. O pesquisador dá como exemplo o próprio PPGE da UFT, onde os alunos trabalham com questões da realidade em que estão inseridos e apresentam também produtos finais como ebooks interativos, podcasts e guias acadêmicos. “São professores de escolas, por isso o impacto social desses programas é muito grande”, explica.
Marcelo Soares ressalta que os programas profissionais merecem tanto destaque quanto os acadêmicos. “Eles foram criados num debate marcado pela complexidade. E hoje vemos a sua qualidade e importância, com interface e especificidades que precisam ser consideradas”, afirma o coordenador do FORPREd.
Damião Rocha também destaca que estar num encontro com mais de 100 representantes de programas de todas as regiões do país discutindo o PNPG é algo estimulante. “Ter a ANPEd levando nossas demandas, principalmente pra nós que estamos na Amazônia, de dimensões continentais, é muito importante”. Atualmente a região Norte possui 16 programas credenciados.
Ao final da plenária e do último dia de atividades, a presidenta da ANPEd enalteceu a importância dos espaços constituídos pelo FORPREd e o diálogo com a diretoria - o Fórum foi uma das primeiras instâncias da Associação a abraçar a proposta de seminários temáticos.
Geovana Lunardi também chamou a atenção para o contexto da política educacional, com demissão de professores e fechamento de universidades confessionais e comunitárias, que têm papel essencial de interiorização. “A construção do PNPG precisa trazer essa solidariedade. É esta construção coletiva de documento que irá pautar as ações e posicionamentos da ANPEd.” Para a presidenta da Associação, o evento em Brasília, na casa de Darcy Ribeiro, dá forças para um futuro imediato em que precisaremos reconstruir o país e retomar Brasília como um lugar que coloque a educação como prioridade, com garantias democráticas.
Por fim, relembrou os presentes das ações que seguem em curso em 2022, com a continuidade do seminários (incluindo projeto das comissões de Ética em Pesquisa e Ações Afirmativas para o segundo semestre), além da previsão de lançamento de novos editais, e a realização do III CONEPEd neste mês de agosto em Natal (RN) e das reuniões científicas regionais da ANPEd até o final do ano.
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