A Revista Brasileira de Educação (RBE) traz em seu volume 25, lote 4, de junho de 2020, artigo sobre "A participação das crianças nas pesquisas: nuances a partir da etnografia e na investigação participativa", de autoria de Natália Fernandes, Professora Auxiliar na Universidade do Minho (UM - Portugal) e Rita de Cássia Marchi, Professora do PPGEd da Universidade Regional de Blumenau (FURB - Brasil). De caráter teórico, o artigo surgiu de um encontro das autoras em Portugal quando Marchi realizava pós-Doc em Sociologia da Infância na Universidade do Minho. "O artigo decorreu de um debate sobre as dificuldades que atravessavam o campo dos estudos da criança no que diz respeito à identificação de métodos de pesquisa com crianças e, principalmente, a utilização do conceito de participação infantil nas pesquisas", contam. "O que nos preocupava, à partida, era o modo não reflexivo como o conceito de participação vinha sendo utilizado em pesquisas, nas quais, muitas vezes, não estava sequer assegurado que as vozes das crianças estivessem sendo consideradas." Confira entrevista das autoras para o portal ANPEd:
Qual a discussão principal da pesquisa que vocês apresentaram em artigo à RBE?
O artigo discute os modos como a participação das crianças nas pesquisas deve ser compreendida em dois métodos de investigação: a etnografia e a investigação participativa. O objetivo do texto é discutir metodologias de pesquisa com crianças, argumentando pela mobilização crítica do conceito de participação, discutindo aproximações, distanciamentos e nuances entre essas duas metodologias e interrogando sobre os modos e significados que a participação das crianças pode assumir nos processos de investigação. O recente desenvolvimento das discussões sobre o significado de voz e de ação social das crianças fez surgir novas propostas metodológicas, onde se pretende ir além também da interpretação das vozes das crianças, fazendo com que a imagem da criança como ator social ganhe uma expressão mais implicada. É assim que, em nosso estudo, consideramos que a etnografia e a investigação participativa, enquanto métodos de pesquisa com crianças, têm dimensões políticas e ontológicas diferenciadas, tendo a participação, portanto, também natureza diferenciada em cada um. Por isto pensamos os significados das vozes das crianças nas pesquisas considerando os quesitos destacados no artigo: a autenticidade, a diversidade e a natureza da sua participação.
Quais foram os resultados e as contribuições esperadas para o debate e compreensão da pesquisa realizada com crianças?
Embora nenhuma pesquisa de campo tenha sido realizada, pois o estudo é teórico e, neste sentido, a pesquisa tem caráter bibliográfico, consideramos que os impactos na área dos estudos sociais da criança sejam no sentido de que o artigo auxilia na elucidação das dúvidas que muitos pesquisadores têm sobre as aproximações e distanciamentos entre a etnografia e a investigação participativa, notadamente no que diz respeito à ideia de participação das crianças: qual participação? De que tipo? Em qual nível?Quando se pode efetivamente afirmar que uma investigação foi do tipo participativa? etc. O que consideramos em nosso texto é que é fulcral repensar o papel dos investigadores em dois sentidos fundamentais e entrelaçados: a transparência ou clareza na enunciação das intenções de pesquisa e da metodologia adotada de modo a definir claramente o tipo (ou natureza) da participação desejada ou permitida às crianças. Neste sentido se coloca o caráter político da ação investigativa.