Reportagem: João Marcos Veiga
Video: Camilla Shaw
Rogério Maciel Nunes pesquisa os impactos do avanço do agronegócio na escolarização de jovens em comunidades no interior do Ceará. “A hipótese que eu levanto é que o aumento desse tipo de trabalho, que não era comum num conjunto de comunidades rurais, interfere negativamente no universo escolar, porque isso atrai os jovens pro mundo do trabalho cada vez mais cedo, mudando uma realidade onde antes se dava a agricultura familiar, com valorização dos filhos nas escolas. Sem falar na expropriação de terras”. Rogério faz mestrado no primeiro programa do interior do Ceará, nas unidades de Quixadá e Limoeiro do Norte, vizinhas de sua terra natal, Russas, marcada pelos impactos do agronegócio. Por sua vez, Raphael Cardoso estuda questões relacionadas à acessibilidade em escolas públicas e estaduais do Paraná. “É um desafio muito grande. A partir do que está previsto no nosso Plano Nacional de Educação, neste ritmo que está nem metade das escolas das capitais terá acessibilidade até 2024”, afirma o pós-graduando pela UFPR e também cadeirante.
O cearense Rogério e o paranaense Raphael têm em comum o fato de acreditarem que para superar os problemas da educação brasileira é preciso entendê-la, analisar políticas públicas, acompanhar o dia-a-dia do ensino, compreender sujeitos, desigualdades estruturais e processos de silenciamento. Este olhar para o cotidiano escolar, numa relação com nuances históricas, políticas e econômicas, é parte fundamental da pesquisa científica em educação produzida no âmbito da pós-graduação, em diálogo com a atuação de professores na rede básica. As investigações citadas acima foram apresentadas nos encontros de pesquisa do Nordeste e Sudeste, que junto às outras três regionais da ANPEd somaram mais de 2 mil trabalhos apresentados em 2018. Num período sombrio de cortes de verba para educação e ciência - que garantem condições mínimas de pesquisa através de bolsas -, assim como de questionamentos sobre a qualidade do que é produzido pelas universidades públicas - a despeito de mais de 90% da pesquisa brasileira estar em tal âmbito, com reconhecimento internacional -, a ANPEd celebra o Dia da Educação neste 28 de abril enaltecendo professores e pesquisadores, com um alerta para o quadro preocupante que vivenciamos.
Clique aqui e confira depoimentos de discentes da ANPEd que apresentaram seus trabalhos nos encontros regionais em 2018, nas cinco regiões do Brasil.
Neste Dia da Educação, diversas entidades, fundações e veículos de imprensa especializados na área se mobilizam através da campanha #Nem1praTrás. Um dos objetivos é estimular a reflexão sobre dados como o de que professores da rede pública recebem em média 40% a menos que outros profissionais com a mesma formação, ou que 40% dos jovens até os 19 anos não concluem o ensino médio e que 1,3 milhão ainda estão fora da escola. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) de 2017 do IBGE, mesmo instituto questionado pelo atual presidente, sendo responsável pelos próprios índices do governo, com credibilidade histórica. Num contexto que se soma a propostas de desmonte do Censo, de cortes de verbas para Filosofia e Ciências Sociais e de negação do acesso a dados que embasam projetos que afetam toda a população, a postura de valorização da pesquisa em educação passa a ser ação de resistência em defesa da educação.
A pós-graduação brasileira possui uma pujante produção de pesquisa nos 181 programas em Educação. As revistas científicas - chegando a cerca de 100 somente na área - dão visibilidade através de artigos a investigações referenciadas por pares nacionais e internacionais, com análises e perspectivas que podem subsidiar políticas públicas e dão retorno à população do investimento na área. Exemplo disso são análises publicadas recentemente na Revista Brasileira de Educação (RBE), que investigam temas como as políticas de diversidade nos governos de 2002 a 2016, comparações entre PIBID e os atuais estágios supervisionados e um olhar histórico sobre nuances da educação de escravizados no século 18 e 19. Contra propostas obscurantistas ou de soluções genéricas, conhecer a educação é o primeiro passo para não deixar #nem1pratrás.