O de Olho na Mídia é uma proposta da ANPEd para estimular a leitura crítica do jornalismo atual em abordagens sobre pautas da Educação. Após publicar reportagem sobre as consequências da reformulação do Ensino Médio imposta por uma Medida Provisória, apresentamos nova edição do “De Olho na Mídia” abordando tal temática. Analisamos alguns veículos de informação para refletir como está sendo pautada a reforma. De forma mais ampla, também focalizamos a atuação de blogs, editoriais e mesmo da comunicação oficial do governo, que igualmente entra na disputa das redes.
O site do Ministério da Educação (MEC) disponibilizou um “Perguntas e Respostas” onde se propõe a esclarecer questões de internautas. As 10 perguntas principais trazem respostas bem elaboradas e, na sequência, apresentam-se outras 19 perguntas mais frequentes. Esta segunda parte traz explicações mais vagas, e 11 das 19 são respostas praticamente idênticas. Ao final da leitura percebe-se que o próprio governo não tem um planejamento assertivo quanto à reforma, deixando em branco questionamentos de especialistas e da sociedade em geral sobre as mudanças futuras. Confira no final da reportagem a resposta padrão utilizada 11 vezes e a lista completa de perguntas.
O governo Temer tem investido muito em campanhas publicitárias para passar projetos como a Reforma do Ensino Médio e a PEC 55. “Se a reforma da Previdência não sair, tchau, Bolsa Família” é parte do texto de uma delas que ameaça os programas sociais, amplamente divulgada no facebook do PMDB. Já foram produzidos sete vídeos publicitários sobre o Novo Ensino Médio.
Lista de vídeos publicitários:
- https://www.youtube.com/watch?v=Qp0_kuVNskk
- https://www.youtube.com/watch?v=bIFgyTLIv4Q
- https://www.youtube.com/watch?v=C-M_ewoa0iY
- https://www.youtube.com/watch?v=kdERkLO3eTs
- https://www.youtube.com/watch?v=7_Fdhibi0yQ
- https://www.youtube.com/watch?v=VDIw07KKHM0
- https://www.youtube.com/watch?v=ih3PpwKVIpk
O Blog Cafezinho elaborou uma tabela, a partir de dados públicos da SECOM, sobre as despesas do governo Michel Temer com publicidade. Nela é possível observar que há um aumento de 27% entre o final do ano de 2015 e de 2016.
Em fevereiro deste ano, foi noticiado que o MEC pagou R$295 mil para youtubers produzirem vídeos publicitários sobre o Novo Ensino Médio. No portal on-line da revista Exame é informado que o material do canal “Você Sabia?”, comandado po Luka Marques e Daniel Mologni, foi produzido durante as ocupações dos secundaristas contra a reforma. “Os youtubers inclusive dizem para os jovens não darem atenção para algumas das críticas que a proposta recebeu. “Acabou gerando uma polêmica também porque tem muita gente reclamando que artes e educação física foram retiradas do currículo básico. Galera, se alguém falar isso para você, nem dê atenção, porque isso nem rolou. O povo fala demais, nem sabe”, dizem.”
Os conteúdos publicitários do governo se apoiam em dois argumentos centrais: a liberdade que o jovem terá para escolher a área que deseja estudar e a possibilidade de se formar com dois diplomas (do ensino médio e do ensino técnico profissionalizante). Esses dois pontos tem sido amplamente criticados por especialistas - confira na reportagem elaborada pela Comunicação ANPEd.
Nos editorias de fevereiro, deste ano, da Folha de S. Paulo e do Estadão, dois dos maiores jornais do país, há uma diminuição dos movimentos de oposição à MP 241. Na Folha justificam o posicionamento contrário por questões corporativas: “O encaminhamento açodado da MP despertou reações, boa parte delas de cunho meramente corporativo, contra o fim da obrigatoriedade da educação física, da educação artística, da filosofia e da sociologia. A saída encontrada por deputados e senadores foi determinar que a BNCC inclua 'estudos e práticas' das quatro disciplinas.”
Por sua vez, o editorial do Estadão afirma que a proposta teve apoio generalizado, ignorando as ocupações históricas que aconteceram no Brasil, a reação contrária dos especialistas da área da Educação e da própria consulta pública no portal do senado, em que apenas 4551 foram à favor e 73565 contra.
“Desde o início, o projeto de reforma proposto por Temer contou com o apoio generalizado de pedagogos e especialistas em educação básica. O único problema foi o modo como a reforma foi proposta, por meio de uma medida provisória, que limitou o tempo de discussões entre as autoridades educacionais, as entidades de professores e as ONGs do setor educacional.”
Vale lembrar que de acordo com a tabela dos gastos com publicidade a Folha teve um aumento de 84,4% no aporte de recursos federais do tipo entre final de 2015 e 2016, e o Estadão de 210,4%. Parece que foram rentáveis as escolhas de Temer.
As notícias sobre o tema na mídia tradicional oferecem um jornalismo basicamente de serviço, apenas pontuando as principais mudanças da reforma. Em geral se limitam a utilizar falas dos representantes do MEC, como o Ministro da Educação Mendonça Filho e a secretária executiva Maria Helena Guimarães, e não entrevistam especialistas na área da educação ou estudantes.
Na matéria do portal on-line G1, de fevereiro deste ano, são expostas as principais alterações que o Ensino Médio sofrerá e pontuado rapidamente, já no final da reportagem, as polêmicas que mais foram divulgadas na mídia, como a questão das disciplinas obrigatórias e ocupações dos secundaristas. Só são utilizadas falas de representantes oficiais do MEC.
As reportagens dos jornais Folha de S. Paulo e O Estadão, na mesma semana, seguiram um recorte semelhante. Deixam para o final as polêmicas e posições contrárias, apoiam-se em falas oficiais do MEC e não entrevistam estudantes, professores ou especialistas das áreas.
Os jornais tendem a contrapor sucintamente os personagens polêmicos. A Folha informa sobre o parecer de inconstitucionalidade do Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, enquanto o Estadão insere uma fala da senadora Fátima Bezerra (PT-RN) lamentando a sanção da MP, por considerar um golpe a juventude.
Já o portal on-line da revista Carta Capital deu visibilidade no mesmo período que as reportagens citadas acima para uma entrevista com Coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara e para um artigo de opinião da secundarista Ana Júlia Ribeiro, símbolo do movimento de ocupações que aconteceu entre setembro e novembro de 2016.
Em uma busca rápida pela internet os sites de notícias geralmente tecem explicações gerais sobre as mudanças do Novo Ensino Médio, mas não dão espaço para as críticas contrárias. Esse é o caso de notícia de O Globo, após a MP ser sancionada, no dia 16 de fevereiro. Dos 18 parágrafos, apenas dois expõem informações sobre a polêmica a respeito da não obrigatoriedade das disciplinas de arte, educação física, sociologia e filosofia. disciplinas obrigatórias. E, rapidamente, cita as ocupações e protestos.
Após a leitura de muitas notícias, encontramos uma que, logo no primeiro parágrafo, traz críticas sobre a nova lei nº13.415, no portal da Revista Valor Econômico. Apesar de a reportagem não trazer entrevistas com especialistas e problematizar as mudanças propostas, ela cita informações pouco mencionadas e extremamente importantes, como o parecer do Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, sobre a inconstitucionalidade da MP e de que a lei não menciona o ENEM - por hora, ainda não há alterações previstas no exame.
O portal do Jornal Zero Hora se propôs a checar informações das campanhas publicitárias do Ensino Médio. Avaliou que uma das afirmações, que 72% dos brasileiros aprovam o novo Ensino Médio, foi feita a partir de uma pesquisa do Ibope encomendada pelo MEC que apresentava pouco sobre as mudanças, e que os brasileiros eram a favor de uma reforma de maneira geral.
Outro ponto que mencionaram é a respeito da efetivação do novo ensino médio. Quando proposto, em setembro de 2016, as campanhas anunciavam que as alterações já começariam em 2017. Contudo, a aplicação da nova lei depende da Base Nacional Comum Curricular, mas que por sua vez ainda não está pronta.
A Agência Lupa, da revista Piauí, também fez um trabalho de checagem, em outubro de 2016. Na época o Presidente Temer justificou a necessidade emergencial de uma reforma no ensino a partir dos baixos resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB).
Lupa percebeu que os índices nos ensinos fundamental e médio aumentaram - o primeiro teve melhor desempenho, contudo não atingiram a meta estabelecida. “Nos anos iniciais do ensino fundamental, a média nacional foi de 3,8 em 2005 para 5,5 em 2015, ultrapassando a meta de 5,2 traçada pelo próprio governo para aquele ano. Nos anos finais do ensino fundamental, a nota subiu de 3,5 para 4,5, no mesmo período. A meta nessa etapa era chegar a 4,7. Por fim, no ensino médio, o Ideb saiu de 3,4, em 2005, para 3,7, em 2015.”