Viemos por meio desta manifestar nosso total estranhamento e indignação pelos indígenas da Aldeia Maracanã (dentre os quais temos professores, educadores, artistas, artesãos, mediadores culturais, bibliotecários, advogados, profissionais da saúde que atuam no SUS, historiadores, gestores ambientais, entre outros) não terem sido sequer comunicados para a audiência da Comissão Nacional de Educação Escolar Indígena (CNEEI), tampouco sobre a primeira reunião ordinária, já realizada no MEC em Brasília nos dias 29 e 30 de agosto de 2023, em qual a pauta de uma Universidade Indígena foi discutida.
É sabida e documentada a participação da Universidade Indígena Aldeia Maracanã nesse processo de educação decolonial, com ampla absorção de demandas pluriétnicas e de ações afirmativas não apenas no território (com campus de 14.300 m²) onde se encontra o prédio do antigo Museu do Índio, mas nos territórios para onde os indígenas levam suas artes, suas histórias, seus saberes ancestrais e possibilitam para que a Lei 11.645/2008 esteja viva e se faça cumprir.
O embrião de tal discussão ocorreu na Cúpula dos Povos na ECO 1992, quando pela primeira vez lideranças indígenas discutiam o clima no mundo. José Guajajara, liderança da Universidade Indígena Aldeia Maracanã estava presente com outros líderes como Raoni Mentuktire, Marcos Terena, Domingos Guarani, Megaron Txucarramãe (cacique Kaiapo) e outros.
Há mais de 20 anos a Aldeia Maracanã é um campo de pesquisa para diversas áreas do conhecimento com acúmulo de discussão sobre a autonomia de conhecimentos ancestrais. No Acampamento Terra Livre (ATL), no início do governo Lula (2003-2006), quando os povos originários ocuparam o Planalto ocorreu a decisão de se criar uma Aldeia Pluriétnica em dois importantes centros, sendo estes, a Aldeia Maracanã no Rio de Janeiro e a Aldeia Tekohaw em Brasília. Fundou-se então em 2006 a Aldeia Maraka'na, advogando por uma Pluriversidade Indígena.
Enquanto polo cultural e universitário, já sediamos o projeto Retorno da Arara Amarela em 2012, financiado com verbas públicas. Já estivemos em eventos nos principais dispositivos culturais da cidade, como Centro Cultural Banco do Brasil, Museu da República, Museu do Amanhã, MAR, Museu da Ciência/ Fiocruz, MUHCAB, I Bienal Indígena no Espaço Hélio Oiticica entre outros. Diversas filmagens já foram produzidas em nosso espaço, com repercussão nacional e internacional.
No dia 19 de janeiro de 2021 recebemos a visita da Secretaria de Saúde e servimos de ponto de vacinação (com os indígenas vacinados no dia 20 de janeiro do mesmo ano), sendo nossos moradores classificados como grupo prioritário, dentro das populações indígenas.
No âmbito acadêmico e das parcerias internacionais, as quais reconhecem a nossa organização como um legítimo espaço universitário, sediamos a estância de outras universidades autônomas indígenas como as da Colômbia, do México e do Equador.
Em 2012 recepcionamos por duas vezes a visita da professora Dra. Catherine Walsh da Universidade do Equador para discutir a nossa Universidade Pluriétnica Indígena Aldeia Maracanã. A visita da professora foi encampada pelo professor Dr. Carlos Walter e, posteriormente, recepcionamos o Ex.mo Ministro Oscar Oliveira, vigente no Governo de Evo Morales. Em 2015 recebemos a Caravana Ayotzinapa, referente aos 43 jovens secundaristas mexicanos assassinados na referida cidade. Em 2022 palestramos na York University, em Toronto no Canadá em acordo bilateral com a Faculdade de Dança da UFRJ.
Atualmente, oferecemos inúmeros cursos na Universidade Pluriétnica Indígena Aldeia Maracanã, como o de Linguasy, o Ciclo Sagrado de Mulheres Indígenas recebendo outras mulheres para falar sobre as medicinas e curas tradicionais, o de Medicina Ancestral Matrilinear, o de Medicina da Floresta, o de Agroecologia, o de Artes, de Saúde Mental Indígena entre outros. Todos articulados e em congregação multidisciplinar para decolonizar e trabalhar a interculturalidade no âmbito universitário/pluriuniversitário.
Entre as demais atividades da Aldeia, ressalta-se ainda o Congresso Intercultural de Resistência dos Povos Indígenas e Tradicionais do Maraká'nà – COIREM, organizado por nós em 2014. Tal congresso obteve mais de 500 participantes, reunindo comunidades indígenas, populações tradicionais e demais redes universitárias autônomas de outros países de Abya Ayala.
Temos, igualmente, já pactuados convênios bilaterais com grupos de pesquisa do CNPq - Brasil como o Grupo de Estudos Maria Lacerda de Moura - CNPq, liderado pela professora Dra. Camila Jourdan (UERJ); Convênio com o CEFET-RJ pela professora Dra. Flávia Pinheiro Meireles (CEFET/ PPRER-CEFET); Grupo de Pesquisa Estudos Ameríndios e Fronteiras (GEAF-CNPq), liderado pelo professora Dra. Danielle Bastos Lopes (UERJ); Dra. Regina de Paula (UERJ – PPGARTES); Dra. Lídia Costa Larangeira, docente da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), coordenadora do Núcleo de Pesquisa, Estudos e Encontros em Dança (Onucleo-UFRJ), entre outros apoiadores que chegam ao nosso espaço solicitando colaboração científica.
José Urutau Guajajara, docente e atualmente Cacique da Aldeia Maracanã, é Pedagogo, Mestre em Linguística Aplicada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e doutorando em linguística na Faculdade de Letras pela UERJ. Oferece cursos de Língua e Cultura Guarani na UERJ desde 2009, tendo participado de inúmeros congressos e fóruns de discussão sobre uma universidade indígena no Brasil e em território internacional. Administra junto com um grupo de indígenas o Centro de Etnoconhecimento SocioAmbiental e Cultural Caiure (CESAC), que há mais de 30 anos leciona nas escolas, museus, Sesc e demais instituições.
Mônica Lima Mura Manaú Arawak, também docente da Aldeia Maracanã, é Bióloga e pesquisadora da UERJ, doutora pela UFRJ (1998), tendo cursado pós-doutorado pela Colorado State University (CSU-EUA-2003). Coordena na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) os projetos: Curso de Língua e Cultura Tupi Guarani aplicados à Medicina e Cosmologia da Floresta (PROINICIAR-UERJ); Educação Indígena e Produção Socio-comunitária (PROINICIAR-UERJ) e o projeto de extensão Espaço Feminista de Acolhimento: Educação Diferenciada Segundo a Saúde Indígena (DEPEXT-UERJ).
Potyra Guajajara, leciona sobre Medicina da Floresta, Arte Indígena, participa do coral Cantos e Encantos e oferta uma oficina sobre as sementes da agrofloresta. Ruth Silva Ribeiro, doutora em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF), é escritora, professora de dança da UFRJ e da Aldeia Maracanã e Julia Xavante, graduada em Educação Artística (UERJ) e docente da Aldeia Maracanã.
Como apoiadores indígenas, listamos o professor Dr. Tonico Benites, doutor em Antropologia Social pelo PPGAS - UFRJ, coordenador do Centro Estadual de Formação Intercultural de Professores Indígenas da Secretaria Estadual da Educação do Mato Grosso do Sul (CEFPI/SED/MS); Kaê Guajajara, cantora e ativista apoiadora da Aldeia Maracanã; Dra. Aline Rochedo Pachamama(Churiah Puri), doutora em História Cultural pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), escritora e ativista, entre outros.
Por todo o exposto, pleiteamos junto à Ex.ma Comissão a nossa participação como integrantes desta Comissão que inicia com o objetivo de constituir uma universidade indígena em território nacional. Como já mencionado, existe em nosso campo de atuação um acúmulo histórico de atividades que propugna a autonomia universitária indígena no Brasil há pelo menos duas décadas. Esperamos assim, contribuir para que a Ex.ma Comissão inaugure uma política pública para o debate de uma universidade autônoma conclamando todos os movimentos de base que já ATUAM como ESPAÇO UNIVERSITÁRIO INDÍGENA no país.
Universidade Pluriétnica Indígena Aldeia Maracanã.
Rio de Janeiro, 17 de setembro de 2023.
Contatos das lideranças da Aldeia Maracanã:
Potyra Guajajara (21) 98032-5022
José Guajajara (21) 99504-7517
Instagram: @ tekohawmarakana
E-mail: urutauhu@gmail.com
perlatenetehara@gmail.com
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