A ANPEd entregou nesta quinta-feira, 29 de junho, relatório final com contribuição da entidade à consulta pública do MEC, baseado nos cincos seminários realizados entre os meses de maio e junho sobre o Ensino Médio. O documento foi recebido diretamente pelo ministro da Educação, Camilo Santana, das mãos da presidenta da Associação, Geovana Lunardi. Também estiveram presentes a Secretaria de Educação Básica, Kátia Schweickardt, Alexsandro Nascimento (DPDI) e Maurício Holanda Maia (SASE), além de integrantes da Diretoria da ANPEd.
O relatório passa agora a estar disponível publicamente para a sociedade civil. Clique aqui para acessar.
Acesse os vídeos dos seminários ANPEd “Ensino Médio: o que as pesquisas têm a dizer?”
O relatório enfatiza que a reforma amplia e produz desigualdades entre a rede pública, rede estaduais e privada, recomendando fortemente a revogação da política do Novo Ensino Médio. A partir de vastas pesquisas acadêmicas sobre a temática e avaliações de especialistas apresentadas nos seminários nas cinco regiões do país, o documento sintetiza estes e outros pontos importantes e preocupantes da reforma do Ensino Médio, tais como:
> a quantidade de municípios com uma única escola no país, o que inviabiliza a oferta e escolha de itinerários formativos;
> a precariedade da oferta dos itinerários formativos;
> as desigualdades de oferta tanto por discrepância de infraestrutura e condições entre as redes quanto pela diversidade de currículos;
> desigualdades entre regiões e municípios;
> a vulnerabilidade social e das juventudes brasileiras;
> a participação do setor privado na implementação em determinadas redes;
> a quebra da concepção de uma educação básica pública, com impossibilidade de oferta de qualidade e abrangente.
Confira alguns pontos do documento:
> Em fevereiro de 2017, por meio da Lei 13.415, o Congresso Nacional realizou uma reforma no Ensino Médio brasileiro. Advinda de um expediente autoritário, a Medida Provisória n. 746, de 22 de setembro de 2016, a reforma concebida pelo governo de Michel Temer tivera origem na Política de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral. A Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd) desde o anúncio já alertava sobre os riscos da reforma.
> A ANPEd, desde 2017, se juntou ao conjunto das lutas pela revogação do Novo Ensino Médio - NEM e endossou inúmeros movimentos nesse sentido. No entanto, o governo federal, que assumiu o mandato em 2019, além de administrar de forma negacionista a pandemia, ainda negou, através de seus ministros, qualquer possibilidade de diálogo com os movimentos sociais, estudantis, associações de professores, profissionais da educação e pesquisadores da área cuja pauta fosse as alterações curriculares nessa etapa da Educação Básica. Chegamos ao final de 2022 com a eleição de um novo governo que teve como mote de campanha “União e Reconstrução” e um dos clamores, manifesto inclusive na Carta da Conferência Nacional Popular de Educação, que aconteceu em julho de 2022, era pela revogação da reforma do Ensino Médio.
> A pesquisa sobre o Ensino Médio no Brasil é sólida, consolidada, e oferece elementos propositivos para o desenvolvimento da etapa final da Educação Básica.
> Os dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, em 2022, são precisos e fundamentam nosso argumento ao demonstrar que ainda temos 2.661 municípios no Brasil com apenas uma escola de Ensino Médio. Como afirmar que as juventudes, após a mudança curricular, estão tendo possibilidade de escolha?
> Em todos os estados do país, a rede estadual, de acordo com a própria LDB 9.394/96, é a responsável por ofertar esta etapa da educação básica. Em 2022 as escolas estaduais de Ensino Médio totalizaram 6.622,359 matrículas na zona urbana e 359.439 em zona rural.
> As juventudes que se constituem como sujeitos a serem atendidos pela política curricular para o Ensino Médio são, predominantemente, as que estão matriculadas nas escolas públicas das redes estaduais. As diferenças e discrepâncias econômicas, geográficas, culturais, sociais e educacionais entre municípios brasileiros impossibilitam a efetivação de uma educação pública de qualidade socialmente referenciada para todos os sujeitos de direitos.
> Levantamento do INEP com os resultados preliminares do Censo Escolar 2022 demonstram que a etapa do Ensino Médio no país se dá efetivamente na rede estadual, visto que nesta estão 84,2% das matrículas.
> É impossível desenhar um currículo que não considere as desigualdades e as especificidades de estados e municípios brasileiros. As escolas são compostas por sujeitos diversos e cada rede de ensino tem suas próprias singularidades. Ao nos reportamos aos dados educacionais, chama nossa atenção o quantitativo de municípios do país com uma única escola de Ensino Médio.
> Enfatizamos que pesquisadores do campo do currículo há tempos alertavam sobre reformas que vinculam reestruturação curricular, materiais didáticos e testes externos e internos padronizados sem considerar as necessidades das instituições de ensino a partir dos sujeitos que a compõem: estudantes, docentes, servidores e suas respectivas comunidades.
> Segundo pesquisa de Cassio (2023), existe uma forte relação estabelecida entre grupos vulneráveis e redução na oferta de escolha do itinerário formativo.
> A situação de violência sofrida pelos jovens, essencialmente, nos segmentos em maior situação de desigualdade e vulnerabilidade é uma ruptura com o direito à vida dessas populações.
> Dados de pesquisadores individuais e de institutos de pesquisa para fundamentar o nosso argumento de que a continuidade destas mudanças nos currículos da etapa do Ensino Médio prejudicará o acesso, a permanência e a formação, essencialmente, dos jovens das escolas públicas estaduais que são os mais vulneráveis socialmente.
> Concordamos com o pesquisador, Prof. Teodoro Zanardi, em exposição no seminário da região Sudeste, quando este questiona não apenas a legislação destinada ao Novo Ensino Médio, mas “o pacote de medidas que foram impostas de 2016 até 2022, por governos que desconsideraram as desigualdades sociais, econômicas e culturais e buscaram uma homogeneização impossível de se concretizar em um país diverso como o Brasil.
> Enfatizamos, ainda, a partir do Censo 2022, a diminuição no número de matrículas de estudantes na modalidade Educação de Jovens e Adultos. Esta modalidade que atende a quem não teve oportunidade na idade pré-definida como mais adequada, compreende vítimas de desigualdades sociais, econômicas e educacionais ao longo de suas vidas, requerendo mais particular atenção.
> A ANPEd também reafirma que currículo é mais que uma lista de conteúdos, itinerários, protagonismo, projeto de vida, eletivas. Currículo é criação, diversidade, vida, direito de todas as juventudes brasileiras, que precisa ser elaborado por seus atores, ou seja, estudantes, professores, servidores técnico-administrativos, representação de pais e comunidade, que o criam no interior de cada instituição do país cotidianamente.
> A ANPEd ao longo dos seus 45 anos vem contribuindo com pesquisas de estudiosos vinculados a programas de pós-graduação no Brasil que ajudam a refletir sobre a finalidade e o alcance das políticas públicas de educação no país, em seus respectivos momentos históricos. Por isso, ao início de um novo governo comprometido com o campo democrático, valorizamos a abertura do Ministério da Educação dando atenção a reinvindicações de movimentos constituídos por estudantes, docentes e pesquisadores, que enseja debates, audiências, webinários, consultas públicas e outras formas participativas de contribuição.